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Barakamon: se esforçar é o melhor dos talentos

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Nenhuma outra frase me marcou tanto como essa quando assisti o anime Barakamon. Nenhum outro trecho mexeu tanto comigo quanto os segundos que trouxeram esse ensinamento. Até anotei e agora, por acaso, reencontrei, em dias muito propícios, que me levaram novamente a essa reflexão: ser capaz de se esforçar é o melhor talento de todos.

Acredito que algumas falas podem definir a ideia central de um conteúdo. É como um título, sem ser. Como um resumo, uma foto 3×4, a síntese de toda uma história em apenas um diálogo — ou só uma frase, no caso de Barakamon.

Barakamon-Kido-animesun
Kido Hiroshi

A frase vem do desabafo de um personagem, Kido Hiroshi, que não é o protagonista, porque esse posto é do calígrafo Handa Seishuu. Um artista super talentoso, que numa crise de estresse constrangedora, agride um crítico da arte somente porque ele afirmou que o trabalho dele não dizia nada. Então, Handa é mandando pela família — e pelo pai também calígrafo — para uma cidade-ilha no interior do Japão, para ter um período sabático de descanso mental.

A explosão de Handa Seishuu: a agressão que o levou ao isolamento forçado
A explosão de Handa Seishuu: a agressão que o levou ao isolamento forçado

Sinopse: Como punição por socar um famoso caligrafista, o jovem e belo calígrafo Handa Seishu é exilado em uma pequena ilha. Como alguém que jamais viveu fora de uma cidade, Handa tem que se adaptar à seus novos vizinhos excêntricos, como pessoas que viajam a trator, visitantes indesejados que nunca usam a porta da frente, crianças irritantes que usam sua casa como parque de diversões, etc. Esse cara poderá lidar com todas essas maluquices? Descubra isso nessa ilha excêntrica de comédia e cheia de inocência e ria!

Pois é, curiosamente estou falando de uma comédia, e é em meio a muita risada que aprendemos e crescemos junto com Handa durante apenas 13 episódios.

O pincel e arte da caligrafia
O pincel e arte da caligrafia

Como todo artista, o calígrafo Handa Seishuu tem momentos de forte inspiração, oscilando com dias de puro trabalho, em busca do traço perfeito. Eu nem sabia da existência da arte no Japão até assistir o anime e fiquei completamente encantada. Uma pintura que se baseia principalmente em desenhar kanjis (caracteres japoneses), mas que diga muito por meio de símbolos — no caso japonês, uma típica tipologia milenar oriental. Acho que é uma identificação óbvia para mim, como fotógrafa, e talvez tenha o mesmo efeito num artista plástico. Nosso trabalho tem que cativar de primeira em uma imagem.

“Star”
“Star”

Handa tem instantes de muita inspiração como o ótimo episódio em que se perde na ilha e de cansaço, se deita numa grama com vista privilegiada do céu e das estrelas. E dessa situação de azar, cria um de seus melhores quadros e também meu preferido — Star — por ser muito abstrato. Porém, artistas são humanos, com defeitos e qualidades, dias bons e ruins. Handa Seishuu além de jovem, bonito e talentoso, é também arrogante, narcisista e egoísta. Deu para entender melhor porquê ele não sabia receber críticas sem ter um ataque histérico?

Sou suspeita a comentar por adorar histórias sobre amadurecimento, é natural que Barakamon tenha me conquistado. Mas não é por isso que gostei, e sim pelo anime mesmo em poucos episódios, conseguir transmitir a mensagem com qualidade. Tanto visualmente — o anime é super bem feito e tem paisagens lindas — como em roteiro.

Handa e os amigos que ganha na Ilha Goto
Handa e os amigos que ganha na Ilha Goto

O calígrafo antes recluso, acostumado a se isolar em sua casa numa metrópole como Tóquio, tem que conviver com os inconvenientes habitantes da Ilha Goto, pessoas que o julgam como a distração que lhes faltava em meio ao “tédio” da normalidade. E essa situação leva a ambos — povo de Goto e Handa Seishuu — a uma troca de experiências e realidades diferentes, um aprendizado e crescimento pessoal. Outro bom episódio é do primeiro trabalho influenciado pela ilha e sua sociabilidade forçada — o quadro Fun (diversão em inglês).

“Fun!”
“Fun!”

Barakamon até tem uma personagem antagonista: a fofíssima e agitada Haru, que bagunça completamente com a vida e a casa de seu “sensei” Handa-kun. Entretanto, nessa história, o vilão e maior inimigo de Handa Seishuu é ele mesmo e suas limitações, como pessoa antissocial e artista em desenvolvimento. Sua evolução é a batalha que acompanhamos. A grande questão a ser revolvida. Quantas vezes nossos maiores inimigos não foram nós mesmos? Tornar-se uma pessoa melhor através das relações pessoais e de amizade é a reflexão principal que o anime oferece.

Impossível não amar: Haru, a criança feliz que só quer brincar sem saber de mais nada.
Impossível não amar: Haru, a criança feliz que só quer brincar.

Mas não foi o que grudou na minha cabeça. O que eu nunca esqueço é como, apesar de talentoso e tendo vivido com aquela arte a vida inteira através do pai, ainda assim Handa passa dias e noites treinando isolado em sua casa, pintando mil vezes a mesma tela, o mesmo desenho.

A “obra prima” até poderia surgir nas horas mágicas, nos sopros de inspiração. Morando na ilha, Handa passa a ter momentos de procrastinação, já que seus vizinhos não o “deixam em paz”. Mas toda a virtuosidade do calígrafo estava lá, o tempo todo, em cada segundo e suor de sua dedicação constante. Kido percebe isso, e decide, graças a influência involuntária do penetra de Goto, se esforçar mais nos estudos e dar um rumo a sua vida.

Handa após pintar, em um de seus momentos de puro êxtase e inspiração.
Handa após pintar, em um de seus momentos de puro êxtase e inspiração.

Todos têm uma tendência natural a ser melhor em algumas atividades, mais que em outras. De se destacar em alguma coisa. Mas eu, a autora desse texto, acredita que não importa o dom que tenhamos, se você não cuidar dele e cultivá-lo todos os dias, não praticar, vai ser inútil, ele vai ficar empoeirado e enferrujado. Precisamos ser produtivos e proativos em nossas vidas. Porque no fim, ser capaz de se esforçar é o melhor talento de todos.

Haru <3
Haru <3

P.S.: A trilha sonora de Barakamon é muito boa!
Até mais!


Texto publicado originalmente em: medium.com/@kekoutz